Belém, "a Ilha do Calor": desafios climáticos no contexto da COP 30
- Revista Cabanos

- 25 de out. de 2024
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Atualizado: 12 de out.
Anunciada como sede da 30ª Conferência das Partes da ONU, Belém passa por melhorias na infraestrutura enquanto enfrenta desafios climáticos intensificados pelo aumento das ilhas de calor
Por Luiza Amâncio e Marcos Maia
Belém será sede, um evento que visa discutir mundialmente questões relacionadas aos impactos ambientais. Os olhos do mundo estarão voltados para a capital paraense. As temperaturas estão se intensificando cada vez mais e Belém, conhecida como a “Cidade das Mangueiras”, lidera o ranking das cidades menos arborizadas do Brasil. Os corredores de árvores nas principais ruas do centro da capital e espaços verdes como o Bosque Rodrigues Alves e o Museu Paraense Emílio Goeldi não são suficientes para conter as ondas de calor.
Esse aquecimento que atinge a capital é um fenômeno previsível, causado pelo acúmulo de construções civis, como prédios e pavimentações, que retêm o calor e o dissipam de forma mais lenta. Com a falta de arborização em Belém, que no ano que vem será sede da 30ª Conferência das Partes da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudanças climáticas, a COP 30, o cenário climático se agrava para quem vive na cidade.
O aumento de construções para abrigar eventos e atividades relacionadas à conferência pode intensificar ainda mais esse efeito. Novos edifícios e infraestruturas exigem o uso de concreto e asfalto, que não apenas absorvem calor, mas também dificultam a circulação de ar natural. Não tem sido implantada medidas adequadas para mitigar esse impacto.
“É como se fosse um buraco na floresta, e aí, como a cidade é feita de concreto e asfalto, as ondas do sol ficam retidas nas construções, armazenando calor”, afirma o professor Luiz Augusto Silva de Sousa, da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA).
Exemplo disso são as construções que estão ocorrendo em toda a cidade, seja no âmbito de mobilidade urbana, edifícios ou, principalmente, intervenções civis voltadas para a COP 30. Parque da Cidade, Parque Linear da Tamandaré, Complexo Porto Futuro, a Nova Doca, o BRT e outras obras estão sendo realizadas simultaneamente às vésperas do evento.

A criação da Avenida Liberdade na região metropolitana, embora vista como um avanço para a mobilidade urbana, tem gerado sérios impactos ambientais, destacando-se o desmatamento e o aumento das ilhas de calor. A remoção de áreas verdes compromete a biodiversidade e a regulação do clima, intensificando o calor urbano e aumentando a demanda por energia elétrica.
Embora essas obras sejam feitas para melhoria e preparação da cidade, o acúmulo de construções em um curto espaço de tempo pode aumentar as ilhas de calor, mesmo com o planejamento ambiental necessário. Esse planejamento visa apenas minimizar os danos causados pelas estruturas, mas não combate completamente seus impactos, o que contribui para o aumento da temperatura.
O histórico de arborização de Belém, tanto nos centros urbanos quanto nas periferias, carece de ações efetivas e benéficas para a infraestrutura. Para se construir uma cidade mais verde, são necessários anos de preparação até que os resultados se tornem visíveis. As ações de arborização da cidade têm um prazo de médio a longo, e todo o processo de transformação não ocorre de imediato.
A população local está na linha de frente das mudanças climáticas. Com a cidade pouco arborizada, moradores reclamam da falta de espaços verdes, principalmente nos bairros periféricos. Antônia Oliveira, moradora do bairro da Terra Firme, queixa-se do calor excessivo e da falta de sombra nas ruas.
“Olha... sinceramente? A cidade já é quente naturalmente, mas sem um ventinho fresco ou uma sombra pra eu me sentar na calçada não dá! A cidade é só concreto, mana, e eu só vejo árvore quando chego mais perto do centro”, diz Antônia.
Relatos como esse são recorrentes, especialmente na temporada de poucas chuvas. O principal objetivo da arborização é proporcionar uma atmosfera de bem-estar para a população. Quando não existe ou é mal gerida, os efeitos são negativos para os moradores.
O professor Luiz Augusto Silva de Sousa, doutor em ciências agrarias, é docente e coordenador do curso de agronomia da UFRA. Com experiência nas áreas de Biologia Vegetal, Ecologia, Educação Ambiental, floricultura e paisagismo, ele compartilha sua visão sobre a arborização da cidade e os desafios enfrentados.
"A arborização serve para isso: ela absorve a radiação e faz com que a sombra proporcione uma temperatura mais amena. Não aquece tanto o asfalto, as calçadas, e o solo fica mais agradável. Quando não tem árvore, o aquecimento na superfície é muito maior, aí formam-se as verdadeiras ilhas de calor”, afirma o professor da Universidade Federal Rural da Amazônia.
As construções em andamento são apresentadas pelos governos como melhorias urbanas para a COP 30, visando o desenvolvimento da cidade com sustentabilidade e criando um legado para a capital paraense. No entanto, a sociedade enfrenta dificuldades para ecoar a temática do evento. Mesmo sendo uma metrópole na região amazônica, Belém ainda não prioriza, de forma concreta, uma cidade mais verde.
Um dos principais obstáculos para a criação de mais áreas verdes é a falta de gestão pública ambiental eficaz. As iniciativas de plantio são pontuais e não levam em consideração fatores como espaço disponível e infraestrutura local. Isso resulta em árvores mal posicionadas, que não conseguem causar os efeitos esperados.
Além da estética e do bem-estar, a elaboração de um plano diretor que integre a preservação das árvores ao desenvolvimento urbano precisa conciliar e incluir a vivência das comunidades periféricas. A maioria das áreas verdes de Belém está concentrada em bairros nobres ou em canteiros centrais das avenidas, como os ipês na Avenida Almirante Barroso.

“Quando há uma iniciativa, é nas principais avenidas, em canteiros centrais. Mas anda gente? Não anda! Apenas carros, e as pessoas andam na sombra do fio elétrico... Poderia ter árvores ali”, comenta Luiz Augusto.
Enquanto o centro da cidade recebe maior atenção em relação às áreas verdes e à infraestrutura, as periferias frequentemente ficam à margem desse planejamento, resultando em ambientes urbanos pouco saudáveis e desconfortáveis. A falta de arborização nas periferias de Belém afeta diretamente a qualidade de vida dos moradores. A escassez de árvores contribui para a elevação das temperaturas, criando ilhas de calor.
Apesar da existência de uma política pública na Câmara Municipal de Belém voltada para a preservação do meio ambiente e a arborização da cidade, a Lei 8.909, de 2012, ainda se mostra insuficiente. Essa situação reflete a carência de manutenção adequada e incentivos para o cumprimento das metas de manejo sustentável. Além disso, o monitoramento dos programas existentes e a avaliação frequente de sua eficácia são essenciais para alcançar resultados duradouros.
Com a aproximação do maior evento sobre ações climáticas, a atual gestão prevê melhorias e atitudes para arborizar e preparar a cidade a tempo da conferência. A prefeitura de Belém está implementando medidas para aumentar as áreas verdes nas ruas e avenidas da capital, como o projeto de arborização na Avenida Almirante Barroso.
Desde o anúncio de que a COP 30 seria realizada em Belém, a cidade recebeu apoio governamental para a implementação de espaços verdes, preparando-a para o evento e criando um legado ambiental. Esse estímulo oferece uma esperança de que a COP traga mudanças duradouras. Apesar de ainda serem insuficientes, essas iniciativas são importantes para o combate às mudanças climáticas.
“Deu-se o primeiro passo para que Belém se modernizasse e constituísse mais espaços agradáveis”, diz o professor.
Veiculação: Revista Cabanos - Primeira Edição







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